terça-feira, 24 de dezembro de 2013

25 de dezembro / 2013 - Natal



    A PALAVRA DE DEUS SE FEZ CARNE 

    1ª leitura: (Is 52,7-10) Alegria da boa-nova; salvação universal – Os reis de Israel não trouxeram a salvação para o seu povo, mas o abandonaram. Deus, ao contrário não o abandona. Ele o reconduz e reconstrói a cidade destruída. Ressoa agora a boa-nova: “Deus é rei”, e não só de Israel e Judá, mas de todos os povos. Ele os outorgará liberdade e paz, se eles quiserem reconhecer e aceitar sua oferta. * cf. Rm 10,15; Mc 1,15; 16,15-16; Ez 43,1-5; Sl 47[46],3; 97[96],1.
    2ª leitura: (Hb 1,1-6) As palavras provisórias e a Palavra definitiva de Deus – Em Cristo plenificaram-se todas as manifestações de Deus. Ele venceu morte e pecado: a glória de Deus se manifestou nele. A fé na sua obra redentora e glorificação junto ao Pai fundamenta a esperança de nosso pleno acabamento. * cf. Sl 110[109],1; 2,7; 2Sm 7,14; Sl 97[96],7.
    Evangelho: (Jo 1,1-18) A Palavra de Deus se tornou existência humana – Jesus é tudo o que é manifestação, “palavra” de Deus para nós, desde a palavra da criação e mesmo antes! Ora, esta manifestação de Deus, sua Palavra, é “carne” (1,14), existência humana mortal. A Palavra faz sua morada carnal em nosso meio e, nesta existência humana vivida até a morte, revela-se a nós a glória de Deus, como no seu santuário. Para nós, isso significa decisão: adesão ou rejeição. * 1,1-5 cf. Gn 1,1-5; 1Jo 1,1-2; Cl 1,15-20; Jo 8,12 * 1,9-14 cf. Jo 12,46; 1Jo 3,2; 5,13.18; Ex 25,8; Jo 17,5 * 1,16-18 cf. Cl 2,9-10; Jo 6,46; Cl 1,15. 
    ***   ***  *** 
    Se, nas celebrações anteriores, o acento cai na humildade do Messias, na missa do dia é realçada sua eterna grandeza. As duas missas anteriores revelam uma cristologia da “quenose” (esvaziamento/despojamento), a do dia, uma cristologia da glória, do senhorio do Cristo, antecipada na preexistência antes dos séculos. Eis a economia da salvação: Jesus se despojou assumindo nossa condição humana para que nós participássemos de sua glória de Filho de Deus (oração do dia; o mesmo tema é lembrado diariamente na missa, ao misturar-se água ao vinho).
    A liturgia expressa menos que a da noite a misteriosa transparência do divino na condição humilde do menino de Belém, mas proclama sua glória “sem véu”. “Teu Deus reina” soa agora o brado que lembra a volta dos exilados (antífona de entrada). “Cantai ao Senhor um canto novo, pois ele fez maravilhas” (salmo responsorial).
    O tema da manifestação da glória de Deus é acentuado pelo tema da Palavra (2ª leituraevangelho). A cristologia da exaltação e da preexistência, em Hb e em Jo, está a serviço da manifestação de Deus (cf. tb. “todos verão”, na 1ª leitura). Aos que discutiam se Jesus devia ser contado entre os homens ou entre os anjos, o autor de Hb diz que ele supera a todos (Hb 1,4). O importante para nós sabermos é que Jesus mostra na sua existência terrestre o que o Céu nos quer comunicar: ele é a Palavra que está em Deus desde sempre – a Palavra definitiva, depois da tantas provisórias e incompletas que chegaram até nós através dos profetas.
    Essa cristologia da Palavra preexistente é proclamada grandiosamente pelo prólogo do João (evangelho). “No princípio” (cf. Gn 1,1) era a Palavra (da criação, Gn 1,3 etc.), e esta Palavra é aquele que veio ao mundo, o qual a recusou (Jo 1,5.9-11). Tornou-se carne como a nossa, mortal como nós (Jo 1,14, cf. Hb 4,15), e exatamente nessa condição mortal – dando sua vida em amor até o fim – manifestou-se a glória de Deus em Jesus (Jo 1,14.16-18). Nessa carne manifestou-se o ser de Deus, que é amor (cf. Jo 3,16; 1Jo 4,8-9). Assim, o Deus invisível em sua glória se deu a conhecer (Jo 1,18). Tudo o que foi, é e será comunicação de Deus, Jesus o é, desde o começo. Ele é Deus (1,1-3).
    A cristologia da preexistência garante que o que Jesus diz e faz, Deus é quem o diz e faz: “É o Pai que realiza em mim sua obra” (Jo 14,10); “Quem me viu, tem visto o Pai” (14,9). Nesse pensamento temos um eco de Pr 8,22-36 e de Eclo 24, que proclamam a obra da sabedoria de Deus no mundo. Não se trata de especulações sobre algum ser celestial que como um astronauta extraterrestre faz uma visitinha à terra! A obra de Deus por excelência, e na qual ele se mostra totalmente, é o que fez o homem verdadeiro e histórico Jesus de Nazaré em nosso meio. Refletindo assim, podemos superar o dualismo que coloca numa bem pequena parte de Jesus sua humanidade e valoriza quase só a parte maior que seria sua divindade (preexistência, onisciência)... O ser divino de Jesus não está à parte, mas está exatamente em seu ser carne. É isso que Jo 1,14 exprime de modo insuperável: a Palavra nasceu (como) carne, e nós contemplamos sua glória.
    Sendo essa a dimensão cristológica desta liturgia, não devemos negligenciar sua mensagem a respeito de nós mesmos: pela encarnação do divino, nosso ser é divinizado (oração do dia) e chamado à vida sem fim (oração final). Portanto, com Cristo devemos viver nossa existência humana “assim como Deus a viveria”. 

    JESUS NASCE POBRE 

    Sete séculos antes de Cristo, o povo de Israel andava oprimido pelas ameaças dos assírios, que já tinham deportado parte da sua população. Em meio a essas trevas – anuncia o profeta – aparece uma luz: nasce um novo príncipe, portador das esperanças que seus títulos exprimem: “Conselheiro admirável, Deus forte” (1ª leitura). Em Jesus, o significado deste nascimento recebe sua plenitude. Ele nasce como luz para o povo oprimido. Seu nascimento no meio dos pobres é o sinal que Deus dá aos pastores (gente bem pobre), para mostrar que o Messias veio ao mundo (evangelho). No meio das trevas, eles se encontram envoltos em luz...
    Celebramos “a aparição da graça de Deus” em Jesus (2ª leitura). A escolha dos pobres como primeiras testemunhas evidencia a gratuidade: nada de aparato oficial. Nós podemos corresponder a esta graça por uma vida digna e pela viva esperança – que se verifica em nossa prática – da plena manifestação da luz gloriosa de Cristo, quando de sua nova vinda (cf. 1º dom. do Advento). Quem acolhe Jesus no meio dos pobres não precisa ter medo de sua glória...
    Reunindo-se em torno do presépio, o povo exprime algo muito importante. Jesus nasceu num estábulo, no meio dos pobres, que foram os primeiros a adorá-lo, porque, para ser o Salvador de todos, tinha que começar pelos mais abandonados. Quem quer ser amigo de todos tem que começar pelos pequenos, pois, se começa com os grandes, nunca chega até os pequenos. A devoção popular do presépio merece valorização e aprofundamento, e não podemos permitir que ela se degenere em algo puramente comercial. À luz do presépio, solidariedade com Cristo significa solidariedade com os pobres. Viver uma vida “digna” (de Cristo) não significa elitismo, mas solidariedade em que se manifestam a graça e a bondade de Deus para todos.


    (O Roteiro Homilético é elaborado pelo Pe. Johan Konings SJ – Teólogo, doutor em exegese bíblica, Professor da FAJE. Autor do livro "Liturgia Dominical", Vozes, Petrópolis, 2003. Entre outras obras, coordenou a tradução da "Bíblia Ecumênica" – TEB e a tradução da "Bíblia Sagrada" – CNBB. Konings é Colunista do Dom Total. A produção do Roteiro Homilético é de responsabilidade direta do Pe. Jaldemir Vitório SJ, Reitor e Professor da FAJE.)

Nenhum comentário:

Postar um comentário