sábado, 23 de novembro de 2013

SOLENIDADE DE CRISTO REI


Reino da Cruz, Reino da Fé

Foi genial a ideia dos compositores da renovada ordem litúrgica, de escolher a morte de Cristo na cruz como evangelho para a festa de Cristo Rei. O quadro imediato para esta escolha deste evangelho foram de um lado, os insultos dos soldados e do “mau ladrão”, e de outro, a prece que o “bom ladrão” dirige ao Crucificado. Todos eles aludem à realeza (messianismo) de Jesus, os primeiros num sentido de escárnio, e o último, ao contrário, com um espírito de fé, que lhe consegue a resposta: “Hoje ainda estarás comigo
no paraíso”.
Para Lucas, o Reino de Cristo inicia realmente na hora da cruz, e dele participa aquele que encarna o modelo comum dos fiéis: o pecador convertido (cf. a pecadora, o publicano, o filho pródigo, Zaqueu etc.) Isso significa, entre outras coisas, que o Reino de Jesus, para Lucas, é essencialmente o Reino da reconciliação do homem com Deus (cf. Paulo em Cl 1,20; 2ª leitura). A verdadeira paz messiânica, para Lucas, não é tanto o lobo e o cordeiro pastarem juntos (Is 11,6-9), mas o homem ser reconciliado com Deus e participar da vida divina, no “paraíso”, restaurando a inocência original.
Deste Reino, o homem participa pela fé, que se expressa na oração (outro tema caro a Lucas): nesse contexto a prece do bom ladrão não é apenas um pedido, mas também uma confissão de Jesus como Rei (“no teu Reino”, 23,42). Como, anteriormente, à guisa de prefiguração, outras personagens receberam cura por causa de sua fé (p.ex., Lc 18,42), o bom ladrão recebe o paraíso por causa dessa fé. Podemos, portanto, dizer que, para Lucas, o Reino de Cristo é essencialmente seu poder de reconciliar com Deus os que acreditam nele. Essa reconciliação tem como centro a cruz, ato supremo de amor e serviço de Jesus para seus irmãos. No homem de Nazaré, morto por amor, Deus se reconcilia com a humanidade, pelo menos, se pela fé e a conversão ela se solidariza com o Filho amado.
A 2ª leitura elabora a mesma visão em termos diretamente teológicos. Deus nos assumiu no Reino de seu Filho amado (Cl 1,13), no qual temos a salvação e a remissão dos pecados (1,14). Segue então o famoso hino cristológico Cl 1,15-20, que canta Jesus como sendo aquele em quem mora a plenitude de Deus: Deus lhe deu tudo, e mais, “quis morar nele com toda sua plenitude” (1,19). Paulo desenvolve sua cristologia num sentido corporativo: Jesus é a Cabeça, a Igreja o Corpo. Ora, a Cabeça não é separada do Corpo. Juntos formam a “Plenitude”. Sacrificando-se Cristo por nós, em obediência, na morte da cruz, nós é que somos reconciliados. Assim – e notemos a alusão à terminologia messiânica – Cristo instaurou a “paz” pelo sangue de sua cruz (1,20).

A 1ª leitura tem função tipológica: indica o início da linhagem da qual Jesus é a plena realização, a linhagem dos reis davídicos, os “ungidos” (cristos), executivos de Deus. Mas Jesus supera de longe o modelo davídico, e seria um anacronismo conceber o reinado de Cristo em termos políticos, como um novo reino de Davi.
Convém refletir sobre o conceito do Reino de Cristo no sentido de reconciliação de Deus com o homem, neste tempo em que tão facilmente o Reino de Cristo é confundido com uma grandeza mundana, tanto na ideologia integralista quanto na revolucionária e libertadora. O Reino de Cristo, na visão da liturgia de hoje, é o acontecer da vontade do Pai na reconciliação operada pelo sacrifício de sua vida, não de modo mecânico ou mágico, mas pela participação da fé. Em outros termos, a fé reconhece a morte de Cristo como um divino gesto de amor por nós e produz conversão e adesão a este mesmo amor, superando o ódio e a divisão. Assim, o Reino no qual Cristo é investido por sua obediência até a morte, implanta-se também no mundo, mediante a fé dos que nele acreditam e seguem seu caminho.
Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes.

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